A Stock Car encerrou a temporada de 2025 cercada de dúvidas, após passar o ano lidando com problemas técnicos. Agora, a principal categoria do automobilismo nacional acelera para 2026 em um cenário em que a crise de imagem pode gerar impactos comerciais.
A Máquina do Esporte apurou que algumas marcas patrocinadoras da Stock Car estão reavaliando se seguirão na categoria no ano que vem ou se deverão diminuir os investimentos.
Antes de mais nada, no entanto, é importante ponderar que o ano de 2026 já seria complicado comercialmente para o automobilismo de qualquer forma por conta da Copa do Mundo. Principal evento do futebol mundial, o torneio costuma consumir os investimentos de marketing e comunicação no universo esportivo. E a do ano que vem será a maior da história, com maior número de seleções, maior número de jogos, três países-sede pela primeira vez e quase 40 dias de duração.
A Vivo, por exemplo, patrocina a Stock Car e a seleção brasileira. Com isso, deve focar os investimentos na Copa do Mundo de 2026. A empresa é uma das marcas que podem não renovar com a categoria.
A Ipiranga, presente na Stock Car com equipe própria desde 2009, já tem saída confirmada publicamente. A Shell, fornecedora de combustíveis e lubrificantes, além de patrocinadora de dois carros do grid, por sua vez, deve diminuir os investimentos.
A General Motors (GM), dona da Chevrolet e uma das principais patrocinadoras da Stock, deverá diminuir os investimentos na categoria. Enquanto isso, Ezze Seguros e Mann Filters ainda avaliam a permanência.
Mesmo com essas “pendências” em relação ao ano que vem, em entrevista à Máquina do Esporte, Lincoln Oliveira, CEO da Vicar, empresa que gere a Stock Car, afirmou que a temporada não abalou a categoria comercialmente.
“Nosso relacionamento com patrocinadores segue sólido, e estamos atendendo às demandas comerciais com normalidade, como em qualquer temporada. Os resultados sustentam essa confiança”, disse o executivo, que também é pai de Gabriel Bortoleto, único piloto brasileiro na Fórmula 1.
“Apenas na Stock Car, encerraremos 2025 com um retorno de mídia próximo de R$ 2 bilhões, número auditado pelo Ibope. Com o projeto do SNG01 consolidado e as inovações que trouxemos ao paddock e à experiência do público, a projeção é superar esses números no próximo ano”, avaliou.
Carro
A temporada de 2025 começou como um momento de virada para a categoria, que deixou os modelos sedans para trás e adotou os SUVs. Chevrolet (com a Tracker), Toyota (com o Corolla Cross) e Mitsubishi (com o Eclipse Cross) formaram o grid.
A Audacetech, braço tecnológico do Veloci Group, controlador da Vicar, recebeu a missão de projetar e desenvolver o carro, batizado de SNG01, do zero. Os motores V8 aspirados deram lugar a unidades de potência com quatro cilindros turbinados, capazes de gerar 500 cavalos.
A grande novidade da temporada, porém, se transformou no maior causador de problemas. O ano foi marcado por diversas dificuldades técnicas, principalmente com os novos motores, que apresentaram quebras e diferenças de desempenho.
“A temporada foi o que todo mundo viu. Acho que a gente precisava dar um passo pra frente, mudar os carros, trazer tecnologia. Mas talvez deram um passo grande demais ou acreditaram em pessoas que não deveriam ter acreditado”, opinou Cacá Bueno, pentacampeão da Stock Car.
Comunicação
A necessidade do desenvolvimento de um novo carro foi vista com bons olhos por grande parte do grid, porém o caminho seguido pela Vicar para as mudanças, não. Figuras do paddock alegam que a promotora teria sido avisada, por exemplo, que os motores quatro cilindros turbinados não eram uma boa escolha.
“Praticamente todas as equipes e pilotos falaram que não ia dar certo esse motor. Foi quase unânime a reclamação do motor, de que turbina é difícil equalizar, um motor com pouca potência, mas com muita potência na parte elétrica”, lembrou Cacá Bueno.
“Tínhamos claro de que não ia dar certo e que agora está sendo modificado, mas através de um pouco de conflito demais. Não adianta falarem que as portas estavam abertas, eu só vim conversar. Não, as conversas foram feitas. Eu disse para tomar cuidado”, acrescentou.
Fontes ouvidas pela Máquina do Esporte apontam que a falta de escuta ativa por parte da Vicar colaborou para os resultados observados ao longo do ano. A empresa, por sua vez, nega qualquer resistência.
“A Vicar mantém canais de comunicação permanentemente abertos com todas as equipes e pilotos. Todos os chefes de equipe e pilotos possuem contato direto comigo, e realizamos reuniões constantes, registradas em ata”, defendeu-se Lincoln Oliveira.
Multas
Durante o ano, os problemas de comunicação resultaram em um afastamento nas relações entre os pilotos e a categoria, que se intensificou conforme as reclamações públicas sobre a situação dos carros começaram a ser feitas.
Em junho, esse afastamento atingiu o auge. Felipe Massa e Bruno Baptista foram punidos com suspensão de benefícios, encarados pelo grid como multas, por realizarem críticas consideradas “desprestigiosas” à categoria por parte da Vicar.
“O [Max] Verstappen acabou de dar uma declaração de que se o regulamento novo [da Fórmula 1] não agradar ele ano que vem, ele se aposenta no final do ano que vem. E ninguém mandou punir o Verstappen porque ele não gosta do regulamento”, comparou Cacá Bueno.
Logicamente, as punições não foram bem vistas no paddock. O movimento criou a sensação de que pilotos e Vicar não estavam do mesmo lado.
“Os pilotos não são a categoria que está atrapalhando o evento. Nós somos o evento. As pessoas vêm aqui ver os pilotos. Na parte técnica e esportiva, no relacionamento com o público, escuta a gente. Temos coisas interessantes para falar, vivemos disso também”, enfatizou o piloto, que está na categoria desde 1996.
Segurança
Durante o campeonato, a segurança oferecida pelos carros aos pilotos também foi questionada diversas vezes. Nas etapas finais do campeonato, essas dúvidas ficaram ainda mais evidentes.
“O chassi precisa de algumas melhorias. Não adianta falar que é seguro. Nós estamos dentro do carro e sentimos, em alguns momentos, insegurança. Serão feitas mudanças para tornar mais seguro. Vamos acreditar que as pessoas são competentes e que isso vai ser feito”, disse Cacá.
Durante o ano, o SNG01 apresentou trincas estruturais em impactos com intensidade considerada insuficiente para fazê-los. O fato somou-se às dificuldades de confiabilidade e alavancou as suspeitas sobre a segurança dos veículos.
A repercussão incomodou alguns fornecedores e patrocinadores. A ArcelorMittal, responsável pelo fornecimento do aço utilizado nas estruturas de segurança dos carros, por exemplo, viu sua imagem ser diretamente danificada.
Durante a disputa da última etapa da temporada, o Grande Prêmio, veículo especializado em automobilismo, tornou público um relatório do Conselho Técnico Desportivo Nacional (CTDN), apontando que os carros estavam inaptos para corridas em 10 das 11 etapas disputadas até então.
A situação abalou a imagem da Stock Car e reforçou as dúvidas sobre o caminho seguido pela Vicar para o desenvolvimento dos novos carros.
“Nossos patrocinadores acompanharam de perto todo o processo de desenvolvimento do novo carro e das inovações implementadas ao longo do ano. Eles reconhecem que projetos de transformação dessa magnitude exigem tempo e ajustes, e valorizaram nosso compromisso com a transparência, os testes rigorosos e o aprimoramento contínuo. A resposta do mercado tem sido positiva, refletida na manutenção e ampliação de parcerias para 2026”, apontou Lincoln Oliveira.
Gestão
Fora das pistas, o ano da Vicar foi marcado por diversas mudanças internas. A promotora passou por uma reformulação promovida por Lincoln Oliveira em diversas áreas.
A “dança das cadeiras” começou com a saída de Fernando Julianelli do cargo de CEO no fim de 2024 para a entrada do próprio Lincoln. O executivo, que estava desde 2020 na Vicar, liderou um momento de expansão comercial da categoria e, de acordo com pessoas próximas, teria deixado a promotora por julgar que passou a ter autonomia limitada, principalmente em relação às decisões das quais discordava.
Ao longo do ano, as demissões chegaram a dezenas de outros profissionais experientes, considerados importantes para diversas áreas de execução da categoria, como diretores financeiro, comercial, de produção e de marketing, entre outros.
A Audacetech também incomoda nos bastidores. A empresa, que foi responsável pelo desenvolvimento do novo carro, tem Enzo Bortoleto, filho de Lincoln Oliveira, como CEO.
Além dos novos motores não terem performado de maneira satisfatória, a falta de aparições públicas para defender a categoria chamou atenção. Nos bastidores, há quem questione a proficiência da Audacetech para executar os projetos pelos quais é responsável, além de sua lucratividade.
Concorrências
A “crise de reputação” com a qual a Stock Car encerra a temporada também pode criar espaço para a expansão de outras categorias. Apesar de ainda se manter como a principal competição do país, a Stock tem acompanhado o avanço de outras representantes no automobilismo nacional.
A Nascar Brasil, por exemplo, dará em 2026 um passo parecido ao dado pela Stock Car nesta temporada. Chancelada pela Nascar norte-americana, a categoria correrá com um novo carro, o “Rise26”, e terá 9 etapas, com 21 corridas.
Ainda assim, há quem entenda que as categorias podem, e devem, coexistir, principalmente por conta dos calendários. A pouca quantidade de etapas em comparação com modalidades de destaque internacional dificulta a hegemonia.
“Os pilotos da Argentina correm em três categorias. Os pilotos da Fórmula 1 correm em 24 eventos, e os da Nascar correm em 32. Não posso correr só 12. Meu patrocinador não para de pé se eu correr só 12 etapas”, ponderou Cacá Bueno.
Em 2025, Stock Car e Nascar tiveram grids com 9 pilotos compartilhados: Cacá Bueno, Rubens Barrichello, Gabriel Casagrande, Thiago Camilo, Julio Campos, Gianluca Petecof, Ricardo Zonta, Bruno Baptista e Galid Osman.
“Preciso entregar para o meu público 24 finais de semana. Preciso estar na rede social, falando de corrida, fazendo ativação, promoção, campanha e incentivo. Não estou tirando meu dinheiro daqui e levando para um outro promotor. Eu estou somando dois dinheiros, porque senão eu não corro”, explicou Cacá.
Expectativa
Em 2026, a Stock Car dará um passo atrás com os motores e voltará a utilizar os antigos V8 aspirados. Com isso, espera-se que uma das principais dificuldades encontradas ao longo de 2025 seja superada.
A decisão, considerada correta pela maioria do paddock, foi interpretada por muitos como um sinal de reconhecimento do erro por parte de Vicar e Audacetech. Além disso, questiona-se quem arcará com os custos da mudança.
“Nossa expectativa é a melhor possível. Não vejo 2026 como ‘redenção’, porque 2025 foi um ano de conquistas importantes: grids lotados, premiações inéditas, quase 250 marcas presentes nos nossos eventos e um interesse renovado de jovens talentos do kart pela Stock Car”, lembrou Lincoln Oliveira.
“Trata-se da segunda fase de um projeto transformador para o automobilismo brasileiro. Com o SNG01 amadurecido e as inovações já implementadas, 2026 será o ano de colher os frutos desse investimento e avançar ainda mais”, concluiu o executivo.
Agora resta esperar. Para 2026, a expectativa é de que a Stock Car tenha um ano de maior estabilidade e, mesmo que inicie a temporada com diversas dúvidas, consiga colocar em prática o potencial que tem para voltar aos trilhos.
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Principal categoria do automobilismo nacional pode ver patrocinadores saírem após ano marcado por dificuldades técnicas e mudanças de gestão
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