É comum associar o sucesso recente do surfe brasileiro à “Brazilian Storm”. Títulos mundiais, medalhas olímpicas e presença constante nas decisões criaram a percepção de que o país encontrou, quase naturalmente, um lugar definitivo no topo do esporte. Mas toda geração extraordinária carrega uma pergunta silenciosa: o que garante que isso continuará acontecendo?
Nos esportes individuais, a lógica costuma ser clara: atletas treinam, competem e evoluem pensando no cenário mundial, não apenas no doméstico. O circuito nacional existe como uma etapa de formação, não como destino final. Deveria preparar para o global, mas nem sempre prepara.
Durante muito tempo, o surfe brasileiro conviveu com essa lacuna. O talento aparecia, mas o caminho até o alto rendimento internacional era fragmentado, irregular e, muitas vezes, solitário. O atleta precisava encontrar suas próprias oportunidades, viajar cedo e aprender fora aquilo que deveria ter sido estruturado dentro. O sucesso vinha, mas quase sempre como exceção, não como consequência de um sistema.
É nesse contexto que, em 2022, nasceu o Circuito Banco do Brasil (BB) de Surfe, uma resposta prática a um problema estrutural. Desde o início, a proposta foi clara: levar competição de alto nível para onde os talentos nascem, percorrer a costa brasileira de Nordeste a Sul e criar um ecossistema contínuo que permitisse aos atletas sonhar e enxergar um caminho para o circuito mundial.
Agora, quatro anos depois, o circuito acaba de entregar sua 18ª edição. Foram 700 surfistas participantes, 26 campeões diferentes e mais de 2 mil inscrições acumuladas, quase 30% delas de atletas com menos de 18 anos. São números que impressionam menos pela escala e mais pelo que revelam: acesso, repetição e continuidade, elementos raros no esporte brasileiro quando se fala em base.
Ao passar por nove estados, o Circuito Banco do Brasil de Surfe se consolidou como o maior e mais diverso palco do surfe na América do Sul, e seu verdadeiro valor não está apenas no ranking internacional, mas também no repertório competitivo que se constrói etapa após etapa. Na pressão real, na leitura de mar em diferentes picos, na convivência com patrocinadores, mídia e rotina profissional, na estrutura de primeira linha e no aprendizado que não aparece nas estatísticas, mas define quem está pronto para competir no mundo.
Esse modelo também altera a relação do mercado com o esporte. Para os patrocinadores, o circuito deixa de ser apenas exposição de marca e passa a ser uma plataforma de desenvolvimento de talentos e narrativas de longo prazo. Marcas acompanham trajetórias, entendem processos e participam da construção de ativos humanos, não apenas da celebração de resultados.
O impacto vai além do esportivo. Cada etapa movimenta cidades inteiras, ativa economias locais e cria oportunidades. Desde 2022, mais de 4 mil profissionais estiveram envolvidos diretamente na produção do circuito: juízes, fotógrafos, salva-vidas, narradores, montadores, produtores e equipes de limpeza, alimentação e transporte. Forma-se, ao redor do evento, uma verdadeira economia do surfe, do vendedor de água de coco aos grandes comércios locais.
Há também um legado ambiental que reforça a visão de longo prazo, com 4 toneladas de lonas reaproveitadas e doadas às comunidades, mais de 1.400 abraçadeiras transformadas em quilhas e raspadores, e planos de gestão de resíduos com triagem em tempo real. Trata-se do esporte e da natureza compartilhando o mesmo propósito, não apenas o mesmo espaço.
No Circuito BB, as 18 edições realizadas, os números superlativos, a presença ao longo de toda a costa brasileira e o impacto esportivo, social, econômico e ambiental revelam uma verdade simples, mas frequentemente ignorada: surfar é extraordinário, mas garantir que os atletas estejam prontos para brilhar no mundo exige trabalho duro fora da água por parte da liga, dos patrocinadores e de todos os envolvidos. E esse trabalho só acontece quando há fomento estruturado, visão de longo prazo e compromisso real com os resultados e comprovações.
No mundo do esporte, quando os recursos chegam por repasses automáticos, e não como consequência direta de um trabalho profissional que precisa gerar valor continuamente, é muito comum que a dinâmica se altere. A sobrevivência deixa de estar vinculada à qualidade da entrega, a urgência perde espaço, e o esforço fora da água passa a competir com outras prioridades. O planejamento sofre menos pressão, e a base vira mais discurso do que promessa.
O Banco do Brasil, ao assumir esse papel de fomento ao surfe, não apenas atribui valores à sua marca e gera benefícios para seus clientes, mas de quebra viabiliza competições e sustenta um ecossistema composto por atletas, cidades e comunidades, ajudando a transformar talentos em troféus. É essa engrenagem, construída fora do mar, que garante que o futuro do surfe brasileiro possa sonhar grande e seguir brilhando mundo afora.
O artigo acima reflete a opinião do colunista e não necessariamente a da Máquina do Esporte
Ivan Martinho é presidente da World Surf League (WSL) na América Latina
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Criado em 2022, Circuito Banco do Brasil (BB) de Surfe tem sido uma resposta prática a um problema estrutural da modalidade no país; hoje, após 18 edições, impacto já é robusto em tudo que envolve a competição
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