A posse do ministro Edson Fachin como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) abre um novo capítulo no equilíbrio entre Judiciário, Executivo e Legislativo em um momento em que o mercado de apostas ganha protagonismo político, regulatório e econômico no Brasil. Nos últimos anos, o Supremo tem sido chamado a decidir temas cruciais para o setor, como a autonomia das loterias estaduais, as restrições à publicidade e a constitucionalidade da Lei 14.790/2023.
Para compreender o impacto da gestão do novo presidente do STF, o SBC Notícias Brasil conversou com o advogado Caio Loureiro, sócio no Tozzini Freire Advogados e especialista em direito público, que analisou como o estilo discreto e institucional do novo presidente pode influenciar o futuro do setor de apostas no país.
“O Ministro Fachin sempre pareceu alguém mais apaziguador, mas que não necessariamente busca protagonismo.”
SBC Notícias Brasil: A posse de Fachin muda algo no equilíbrio político e jurídico em torno do mercado de apostas no Brasil?

Caio Loureiro: Creio que não. O Ministro Barroso sempre foi muito discreto e, em certo ponto, alheio à discussão sobre o mercado de apostas, limitando-se aos votos nos casos concretos que foram analisados pelo Supremo Tribunal Federal.
O Ministro Fachin, em minha opinião, seguirá caminho semelhante, sendo que é um Ministro ainda mais discreto que o seu antecessor. Não o vejo indo à mídia para expressar opiniões sobre o tema – e mesmo em relação a outros temas na pauta do STF – ou adotando uma postura mais aguerrida na condução da pauta e das sessões. A tendência é que ele vá adotar uma postura mais apaziguadora e em prol do equilíbrio institucional, interno e na relação do Supremo com o Legislativo e Executivo.
Nesse sentido, acho que seu mandato deve ser muito mais voltado aos grandes temas políticos e jurídicos – lembrando que há vários na pauta do STF, aguardando julgamento. E, certamente, com o calendário eleitoral conturbado que se espera para 2026, sua preocupação deve estar muito mais voltada aos casos que surgirão em volta das eleições.
É preciso lembrar, ainda, que casos rumorosos devem assumir protagonismo nos próximos meses, desviando o foco de atuação do Ministro para longe de temas mais específicos, como é o caso do mercado de apostas, cujos temas de maior impacto – liberação dos casinos físicos e restrições à publicidade – não devem se sobrepor àqueles de envergadura mais política. Na hipótese de esses temas chegarem ao Supremo, entendo que o Ministro Fachin os tratará sem nenhum privilégio ou viés específico, privilegiando julgamentos mais técnicos.
SBC Notícias Brasil: O estilo de Fachin como presidente pode influenciar o diálogo institucional com Executivo e Legislativo na regulação das apostas?
Caio Loureiro: Creio que essa não será uma pauta prioritária da sua gestão. O Ministro Fachin sempre pareceu alguém mais apaziguador, mas que não necessariamente busca protagonismo. Numa situação em que seja chamado para esse papel, é possível que atue, mas não o vejo chamar a responsabilidade para si.
O seu estilo mais discreto deve fazer com que ele não queira assumir o papel de condutor de algumas disputas, dando maior espaço à discussão entre os outros dois poderes. Entendo que ele será mais atuante em temas mais sensíveis e que envolvam aspectos institucionais do Estado e do próprio STF.

SBC Notícias Brasil: Ministro Fachin já participou de julgamentos importantes sobre apostas e loterias, como a Ação Cível Originária (ACO) nº 3696 e a ADI nº 7.640. Essa experiência pode influenciar sua atuação agora como presidente do STF?
Caio Loureiro: Apenas por esses dois casos, não é possível inferir qual será o posicionamento do Ministro em outros temas sobre o setor, mesmo aqueles já em discussão no Supremo. Na ACO nº 3696, ele não votou por se declarar suspeito. Na ADI nº 7.640, seu voto foi sucinto, limitando-se a um parágrafo. Mesmo na liminar da ADI nº 7721, que pugna pela inconstitucionalidade integral da Lei nº 14.790/2023, ele apenas se limitou a acompanhar o relator na limitação das apostas por menores e beneficiários do Bolsa Família.
Mesmo sem maiores indícios da sua atuação sobre o mercado de apostas, os precedentes até aqui, ao menos, demonstram não haver nenhum viés ideológico do Ministro Fachin. Em nenhum dos seus votos, o Ministro externou opiniões pessoais ou argumentos mais extremados, o que deve indicar que sua posição sobre o tema será eminentemente técnica, a depender do seu entendimento sobre cada tema específico que seja julgado pela Corte.
Como Presidente, conforme já dito, não o vejo assumindo protagonismo sobre a pauta do mercado de apostas. O mais provável é que ele deixe os temas se desenvolverem no calendário natural do STF, sem atuar fortemente na discussão e sem querer assumir, para o STF, o encargo de arbitrar disputas entre os poderes.
SBC Notícias Brasil: Ele chegou a se declarar suspeito em um dos casos mais relevantes do setor, a ACO nº 3696. Esse episódio muda a forma como o mercado deve enxergar sua gestão no Supremo?
Caio Loureiro: Não. Ao que se sabe, a declaração de suspeição ocorreu, exclusivamente, por um ex-assessor do Ministro ser advogado de uma das instituições admitidas como amicus curiae. Isso não evidencia nenhum enviesamento ou restrição por parte do Ministro.
SBC Notícias Brasil: Na última semana, o STF derrubou trechos da Lei das Apostas que limitavam a atuação das loterias estaduais e a publicidade. Com Fachin na presidência, o tribunal tende a manter essa linha ou pode haver uma inflexão?
Caio Loureiro: Entendo que não. A votação foi unânime, inclusive com o voto do Fachin. Entendo que esse é um tema já superado na Corte.
Uma coisa importante, no entanto, é que houve uma ressalva levantada pelo Ministro Gilmar Mendes e acompanhada por parte dos Ministros, acerca da possibilidade, em termos mais genéricos, da União impor regras aos Estados em situações nas quais a Constituição a tenha outorgado competência legislativa, como é o caso das apostas.
Na situação específica, o Supremo entendeu que, de fato, a imposição de dois parágrafos do art. 35-A da Lei 13.756/2018 era inconstitucional – e isso não deve mudar. No entanto, de acordo com a ressalva, é possível que, no futuro, leis federais imponham restrições adicionais aos Estados, na oferta da loterias, apostas esportivas e jogos online.
Nesse ponto, o Ministro Fachin foi um dos que acompanharam essa ressalva. Isso pode ser relevante em discussões envolvendo, por exemplo, limitações à publicidade ou mesmo exigências para a obtenção de licenças e autorizações, pois leis federais poderão acabar ditando os parâmetros que os Estados devem observar.

SBC Notícias Brasil: Para você, a presidência de Fachin pode trazer mais estabilidade institucional ou maior rigor no julgamento dos casos no STF relacionados ao setor?
Caio Loureiro: Não vejo o Ministro Fachin como alguém contrário ao setor de apostas. Inclusive, no julgamento da liminar da ADI nº 7721 – a ação mais adversa, por propor a inconstitucionalidade da Lei nº 14.790/2023 – ele apenas acompanhou o relator (Min. Luiz Fux) na proibição de menores e usuários do Bolsa Família, quando poderia ter ido além e votado em favor de restrições mais graves à Lei.
Mesmo nas outras ações, não houve nenhuma menção específica sobre a legalidade das apostas e jogos online. Isso faz com que não se tenha a expectativa de uma ação mais assertiva contra o setor.
Em termos de estabilidade institucional, o Ministro Fachin – conforme dito acima – é um Ministro que tende à institucionalidade como um todo. Mesmo em seus escritos acadêmicos e na sua trajetória no STF, ele demonstra uma preocupação com segurança jurídica e estabilidade. Não o vejo como defensor de medidas extremadas, não apenas em relação ao setor de apostas, mas em qualquer situação. Em votos sobre temas mais impactantes, ele prima por mais cautela e sem grandes arroubos de ruptura.
Portanto, acredito que ele não irá privilegiar pautas que sejam mais disruptivas ou que tenham motivação claramente ideológica, sempre que entender que delas poderá advir alguma espécie de instabilidade institucional.
SBC Notícias Brasil: Fachin costuma enfatizar a separação entre Legislativo e Judiciário. Isso pode significar que ele poderá frear uma atuação mais intervencionista do STF em questões de apostas, deixando maior espaço para o Congresso?
Caio Loureiro: É possível. Como um ministro tradicionalmente mais low-profile, ele deve escolher com cautela as brigas que irá comprar com o Legislativo. E o momento político-institucional é especialmente abundante em disputas entre os poderes.
A tendência, portanto, é que o Ministro privilegie as pautas mais institucionais e que envolvam temas mais gerais e relevantes do ponto de vista político, jurídico e institucional, o que deve deixar questões setoriais de fora, pela sua especificidade.
De todo modo, considerando que ele sempre foi um ministro defensor do rigor jurídico, em situações extremas de inconstitucionalidade, independentemente do impacto ou da relevância política, creio que ele não ficará inerte.
Fachin toma posse na presidência do STF, mas já é conhecido do setor
Em fevereiro, foi encerrado oficialmente o julgamento no Plenário Virtual da ACO nº 3696, movida pela União por meio da Advocacia Geral da União (AGU) contra a Loteria do Estado do Rio de Janeiro (LOTERJ).
Em decisão majoritária, o STF manteve o entendimento do relator André Mendonça, que suspendeu a exploração de loterias, apostas esportivas e jogos on-line fora dos limites do Rio de Janeiro por empresas autorizadas pela LOTERJ. O ministro também determinou o retorno da obrigatoriedade do uso de mecanismos eletrônicos de geolocalização pelas operadoras licenciadas.
Na votação, os ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Cristiano Zanin, Flávio Dino, Gilmar Mendes e Nunes Marques acompanharam o relator, formando maioria. Luiz Fux e Dias Toffoli também votaram a favor, no entanto, com ressalvas. Na quinta-feira, Dias Toffoli chegou a fazer o pedido de vista no processo, mas o retirou antes do fim do dia. Por fim, o ministro Edson Fachin declarou-se suspeito na votação.
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A posse do ministro Edson Fachin como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) abre um novo capítulo no equilíbrio entre Judiciário, Executivo e Legislativo em um momento em que o 
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